Entendendo o uso de agentes químicos
Todos estão cansados de ver as cenas de manifestantes armados com paus, pedras, coquetéis molotov, bandeiras e do outro lado os policiais militares armados com cassetetes e principalmente com o aspergidor químico, ou spray de pimenta.
Esse equipamento, de uso que remonta os anos 40 no Brasil, passou por evoluções e hoje é um dos principais aliados do Policial nas ações contra baderneiros e em crimes em que é necessário o uso de força não letal.
O princípio do armamento é simples, já que ele é inócuo e não causa sequelas ou lesões permanentes na pessoa atingida, sendo usado como dissuasão psicológica no agressor.
Quando o produto, no caso o jato de pimenta, atinge o rosto do oponente ocorre uma reação normal do organismo, que detecta que devido a dificuldade respiratória, a ardência, a dificuldade de enxergar, existe um risco de morte, que imediatamente acelera os batimentos cardíacos e dispara uma série de reações do corpo e da mente como se a pessoa estivesse a morrer. Com a isso, a primeira medida e se afastar o mais rápido possível e começar a tossir e buscar água.
Obviamente que é uma sensação desagradável e terrível, e que por isso faz com que a pessoa fique incapacitada por alguns minutos e se afaste do local.
Até a década de 90 eram muito comuns os gases lacrimogêneos químicos como o ortobenzilmanolonitrilo e o clorocetofenona, que foram substituídos pelo composto natural de pimenta, o OC, já que os primeiros causavam câncer e efeitos colaterais indesejáveis.
Agentes químicos. Conceito:
Agente Químico é toda substância, produzida quimicamente ou não, que quando usada em pessoas ou animais, produza um efeito tóxico, fumígeno ou incendiário. Este efeito tóxico nas operações policiais militares se restringe a causar efeitos não permanentes e inócuos, porém, incapacitando momentaneamente a capacidade de ataque de uma turba ou de um criminoso.
HISTÓRICO SOBRE USO DE AGENTES QUÍMICOS
O uso de gases tem referência desde a antiguidade, na Grécia, durante as guerras de Peloponeso, no sítio de Platéa em 428 AC, Arquidamos, filho de Zeuxidacuos, rei dos Lacedemônios, fez queimar grande quantidade de lenha misturada com enxofre e pez (breu, piche), nos fossos que circundavam os muros da cidade. Esperava que ventos soprassem favoravelmente, levando a fumaça contendo gases tóxicos e o fogo ao reduto dos defensores. Contudo, sobrevieram ventos contrários causando a retirada de Arquidamos, que ficou desmoralizado. (Monografia do Cap PM Contini, CAO-I/87)
As aplicações de agentes químicos em conflitos armados, são tão antigas como a guerra organizada. Exemplos frequentemente citados são o uso de fumaça irritante, tóxico e outros meios.
Na guerra entre Ateniense e Espartanos (431 a 404 a.C.) foi utilizado um composto químico que consistia em madeira saturada com enxofre e breu para queimar debaixo das paredes das cidades sitiadas, com o objetivo de produzir fumaça asfixiante. Na guer-ra de Constantino contra os Sarracenos, em 673 d.C., foi utilizado um composto conhecido como “fogo Grego” que compreendia: enxofre, cal viva, breu, resina de petróleo. Esta era uma mistura flamejante, normalmente lançada contra o inimigo por meio de catapultas e outros objetos similares a seringas, em forma de dragões, e também foram utilizados pelos Sarracenos contra os cristãos durante as Cruzadas.
As armas químicas foram utilizadas pela primeira vez nos Estados Unidos durante a Guerra Civil, no cerco de Charleston. Nesta ocasião, utilizaram madeira saturada de enxofre e queimaram próxima a cidade na esperança que os ventos levassem grandes nuvens de fumaça asfixiantes para desalojar os habitantes.
A força policial francesa tem o renome de haver sido a primeira organização de polícia que usou um agente químico para desalojar pessoas.
Durante a Primeira Guerra Mundial os gases venenosos foram amplamente utilizados pelos exércitos em luta. Essa nova modalidade de arma provocou escândalo internacional, causando milhares de mortes horrendas. Nos tempos atuais, vários países possuem armamento químico em seus arsenais, porém, desde a primeira guerra mundial, não são mais usados em combate regular.
O Protocolo de Genebra de 1925, que proibia a guerra química e biológica, foi adotado tanto pelos Estados Unidos como pela União Soviética, hoje Rússia, mas proíbe apenas o uso e não a produção dessas armas, o que é um risco, como foi visto no caso do uso do gás Sarin pelo Iraque de Sadam Hussein contra a população civil curda, no norte do páis, considerado um crime contra a humanidade.
PRINCIPAIS AGENTES LACRIMOGÊNEOS
CN – CLOROACETOFENONA
O cloroacetofenona foi descoberto pelos alemães, por volta de 1870. Os franceses foram os primeiros a usar com êxito no final da década de 1920, para controle de distúrbios civis em suas colônias. Posteriormente foi adotado praticamente em todo o mundo para uso por organizações policiais. O CN tem odor semelhante à flor de maçã.
Este agente causa lágrimas e irritação nos olhos, uma sensação de ardor na pele. Seus efeitos primários nos olhos são lacrimejamento e irritação dos olhos. Em alguns casos, dependendo da sensibilidade da pessoa e da quantidade de CN pode ocorrer dermatite (inflamação da pele), podendo provocar queimaduras de até 3º Grau, eventualmente poderá provocar óbito. Há de ressaltar os efeitos residuais que perduravam dias no recinto que foi exposto ao agente químico.
Apesar de causar uma sensação de desconforto não impedia a ação do agressor, sendo que não surtia efeito em indivíduos alcoolizados, dopados ou em animais, sendo comum o aumento da agressividade destas pessoas ou animais.
CS – ORTOCLOROBENZALMALONITRILO
Apesar de durante muitos anos o CN ser o agente químico mais utilizado pelas autoridades civis e militares, havia uma insatisfação quanto ao produto, em decorrência dos efeitos acima apresentados (lesões). Em decorrência iniciou-se intensa pesquisa com o objetivo de substituir tal produto. A descoberta se deu no ano de l928 pelos cientistas americanos Corson e Stoughton, dos quais tirou-se a inicial CS para identificar o produto, mas só em 1956 é que um laboratório inglês tornou viável o seu emprego como agente de controle de distúrbios.
Os efeitos do CS são semelhantes ao do CN, tendo como qualidade uma toxicida-de menor, mas mesmo assim recomenda-se cuidados com o seu emprego. Vários foram os casos em que aerossol de CS provocou lesões graves em indivíduos que receberam os jatos, causando transtornos judiciais para os agentes que o empregaram, sendo que até o final da década de 70, as polícias militares tinham espargidor deste material, mas o seu uso era restrito as OPM especializadas,como o Choque.
AGENTE PIMENTA (OLEORESINA DE CAPSICUM – OC)
Com o desempenho constatado pelos agentes acima mencionados, os órgãos de segurança do mundo, necessitavam de um produto que auxiliasse o policial em ocorrências em que o indivíduo criava situações que obrigava a sua condução a delegacia coercitivamente, sendo inúmeros os casos em que o policiais também se tornava vítima deste infrator.
Entre os diversos materiais optou-se pela pimenta, que já havia sido utilizada como arma em várias épocas nos últimos 2.500 anos. Os chineses usavam-na juntamente com azeite que ao ser queimado produzia uma fumaça irritante e sufocante, os japoneses trituravam-na tornando um pó fino e acondicionavam-na em pequenas bolsas de papel fino, que eram atiradas no rosto dos adversários.
Com a tecnologia atual foi possível refinar a pimenta e retirar a oleoresina de capsicum. Por ser um produto natural, o seu desempenho não apresentou a toxicidade apresentada por outros componentes químicos, a duração dos efeitos residuais foram menores, não perduraram por mais de uma hora, enquanto os demais levavam dias.
O desempenho do agente pimenta surpreendeu, pois criou uma condição em que o agressor não tem condições de reagir, tendo em vista que fica temporariamente cego, provoca um acesso de tosse e espirro, causa à sensação de ardor na pele, espasmos musculares e queimação nas mucosas, inibindo qualquer resistência e fotofobia (sensibilidade às luz).
Um fato novo foi que tal produto surtia efeito sobre animais, que até então ficavam imunes aos outros agentes lacrimogêneos.
O processo para extração do oleoresina de capsicum foi desenvolvido na década de 30, em que a pimenta madura e seca, é submetida a um processo que extrai o óleo.
A proporção para um quilograma de oleoresina de capsicum da pimenta é equivalente a uma quantidade de 18 a 20 quilogramas de pimenta, podendo variar dependendo do tipo da pimenta utilizada no processo.
O início das pesquisas tem origem no ano de 1986, sendo que no ano de 1988, foi apresentado o resultado das pesquisas ao FBI. A partir do ano de 1989, algumas empresas percebendo as vantagens de tal produto, iniciaram uma produção sendo que algumas não desenvolveram esta tecnologia, mas copiaram-na sem muitas preocupações com as consequências que o componente químico produzido poderia gerar no ser humano, diante disto, a Polícia Militar preocupou-se em adquirir um produto que realmente tenha um controle de qualidade e um suporte técnico para sanar eventuais dúvidas que possam surgir.
MOTIVOS DA ADOÇÃO
Diante do comportamento de determinados indivíduos que se apresentavam drogados, perturbados mentalmente ou desgostosos com a vida, era necessário um meio que possibilitasse ao policial dominar o indivíduo, que na maioria das vezes não era um marginal, mas um cidadão que necessitava de cuidados. O spray de gás pimenta permite ao policial deter uma pessoa emocionalmente alterada, sem entrar em vias de fatos com ela, e deixando a arma de fogo para ser usada quando realmente for necessário, isto é, em último recurso.
DESCONTAMINAÇÃO
No caso de contaminação acentuada, lavar com água em abundância e sabão neutro ou solução de bicarbonato de sódio a 5 %.
Não apresenta qualquer efeito tóxico ou colateral adverso, quando utilizado ade-quadamente. Trata-se de um produto de origem essencialmente natural.
O ESPARGIDOR DE AGENTE QUÍMICO
Espargidor de Agente Químico OC
Características Gerais:
Corpo cilíndrico em alumínio contendo solução de agente pimenta pressurizada. O propelente utilizado é o PROPANO-BUTANO.
Emprego
O espargidor de agente químico foi desenvolvido para utilização em ações de auto defesa, controle de pequenos distúrbios e saturação de ambientes. Vale lembrar que seu emprego deve ser pautado na legalidade, evitando abusos e lesões indesejáveis.
Operação
– Segurar o espargidor verticalmente na direção do tórax do agressor; Em alguns casos e tipos de clava de O.C. (pimenta) mira-se no rosto do agressor.
– Pressionar o atuador uma a duas vezes em jatos de 0,5 a 1 segundo;
– Respeitar a distância mínima de utilização de 1 (um) metro entre o espargidor e o agressor. No emprego do espargidor modelo Max esta distância deverá ser de 5 (cinco) metros.
– Evitar o disparo contra o vento.
No caso da clava química de O.C. de espuma deve-se mirar no rosto do agressor.
Descontaminação e primeiros socorros para o CS:
As pessoas afetadas pelo CS devem dirigir-se para o ar fresco permanecendo com rosto voltado para o vento, separar-se e não esfregar os olhos. Em caso de contaminação pesada, o pessoal atingido deve remover a roupa e imediatamente banhar o corpo com copiosa quantidade de água fria e corrente. Também se pode optar por uma solução com bicarbonato de sódio a 10%, para remoção dos cristais do agente lacrimogêneo.
Persistindo os sintomas, procurar auxílio médico.
Descontaminação e primeiros socorros para a OC
Normalmente o procedimento inicial é a administração de oxigênio a 100%, umidificado, além de outros procedimentos de assistência ventilatória, se exigidos. Ou, na impossibilidade destes recursos, voltar-se contra o vento; aplicar álcool, clorofórmio, éter ou benzeno sobre as partes afetadas. Aplicação de pomadas anestésicas à base de lidocaína ou prilocaína.
Persistindo os sintomas, procurar auxílio médico.
Guarda e armazenamento do espargidor de agente químico
– O espargidor de agente químico deverá ser transportado em coldre próprio no cinto do policial, na ausência deste equipamento, pode também ser conduzido em bolsas ou bornais;
– Mantenha-o sempre na posição vertical, pois na posição horizontal a solução de agente químico poderá vazar;
– Evite mantê-lo em porta-luvas de veículos, a presença de calor intenso poderá provocar um grande vazamento;
– Não forneça o espargidor para pessoas não habilitadas;
– O ideal é armazená-lo em local seco e arejado, longe do alcance de crianças.
– Produto inflamável, JAMAIS use o espargidor em uma pessoa e depois use a arma de incapacitação neuromuscular elétrica (taser), pois há risco de combustão.
TÉCNICAS DE USO
1. Nunca disparar contra o vento;
2. Respeitar a distância mínima e máxima, para cada versão; e
3. Valer-se do fator surpresa para o uso.
ORIENTAÇÕES DIVERSAS
Para armazenamento, recomenda-se: local arejado, umidade relativa controlada entre 60 e 80 % e temperatura entre 22 e 38º C.
É um produto inflamável, pois a oleoresina de capsicum tem como solvente o álcool (90%), portanto, evitar espargir o produto em direção a fogo.
CONSIDERAÇÕES LEGAIS
O controle deste tipo de produto é exercido pelo Exército Brasileiro, auxiliado pelas secretarias de segurança pública, assim como prevê o disposto no art. 34 e incisos do R-105, aprovado pelo decreto nº 3665/2000. Este decreto com irrelevantes restrições foi plenamente recepcionado pela nova ordem jurídica relacionada a armas de fogo e demais produtos controlados e, não bastasse isso, passou a ser, juntamente com as portarias baixadas pelo Comando do Exército, uma fonte normativa suplementar aos delitos tipificados no Estatuto do Desarmamento. Ressalte-se que, além das armas de fogo, munição e acessórios, outros produtos controlados foram classificados no Anexo I do R-105, estando, entre eles, os produtos químicos.
É importante apontar alguns aspectos legais para que o agente não fique à mercê de situações delicadas, permitindo-o que execute a ação prevista dentro dos ditames legais em que a norma o autoriza. Podemos destacar, como principais recursos legais que justifiquem o emprego razoável do agente químico, a legítima defesa, o estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular de direito. Todos estes dispositivos estão previstos na Lei Penal Brasileira nos artigos 23 a 25. A legítima defesa como assim ensina o art. 25 da lei supra, exige a existência de alguns requisitos para caracterizá-la, quais sejam: reação a uma agressão atual ou iminente e injusta; defesa de um direito próprio ou alheio; a moderação no emprego dos meios necessários à repulsa; e o elemento subjetivo, isto é, o agente tem de agir com o fim de repelir tal agressão injusta e ter ciência que não está praticando ato ilícito.
Também não há crime quando o agente pratica o fato no estrito cumprimento de dever legal (art. 23, inc. III, primeira parte do Código Penal). Quem cumpre regularmente um dever não pode, ao mesmo tempo, praticar ilícito penal, uma vez que a lei não contém contradições; assim ensina em seu magistério o doutrinador penal Júlio Fabbrini Mirabete. Agem em estrito cumprimento de dever legal, policial que emprega o espargidor de agente químico para cumprir um dever (impedir a ação de pessoa armada que está praticando um ilícito ou preste a fazê-lo, controlar a perturbação da ordem pública etc.), assim tem decidido os órgãos jurisdicionais. Em exercício regular de direito (art. 23, inc. III, se-gunda parte) entendemos que, qualquer pessoa pode exercitar um direito subjetivo ou faculdade prevista na lei penal ou extrapenal. Fica claro que será acolhida pela excludente em tela, a pessoa devidamente habilitada e autorizada que, ao portar uma clava química, a utiliza para expulsar pessoas que entram abusivamente em sua residência.
GRANADAS LACRIMOGÊNEAS INDOOR
A mudança no projeto das granadas explosivas GL: -304, 305, 306 e 307, deu-se devido a uma exigência da PMESP, em decorrência do Laudo Pericial n.º 062/53/94, de 22Out94, emitido pelo 3º BPChq, GATE, que através de estudos permitiu no primeiro momento o desenvolvimento do “duplo estágio”, isto é, a granada é lançada e há uma pequena explosão que lança o capacete, para sem seguida haver o explosão do artefato. O passo seguinte, em decorrência dos fragmentos, foi a substituição do corpo das granadas, que era polímero, por borracha.
Olavo Mendonça.
Referências e Bibliografia:
– Manual de Operações de Choque. PMDF. Major Paim. 2005. M2PM.
– Batalhão de Operações Especiais. Apostila sobre agentes químicos: elaborada pelo Cap. QOPM Rômulo Flávio Mendonça Palhares. [S.l., s.n.]
_ Manual de Operação da Clava Química. SGT Mainar Feitosa da Silva Rocha.
_ APOSTILA DE AGENTES LACRIMOGÊNEOS. PMSP.
_Apostila de Agentes Químicos. Força Nacional. Ministério da Justiça. CAP QOPM CECÍO DOS SANTOS SOUZA.
_ CURSO DE CONTROLE DE DISTURBIOS CIVIS. 2000. PMSP.
_ M-8-PM – MANUAL DE CONTROLE DE DISTÚRBIOS CIVIS – 2ª EDIÇÃO – PMESP – 1992.;
_MONOGRAFIA : ATUAÇÃO EM PRESÍDIOS ,Cel RES PM JOSÉ CARLOS BONONI ;
_NORMAS GERAIS DE AÇÃO DO 3ºBPChq. PMSP.
_APOSTILA DE CINOTECNIA NÍVEL I.PMSP
_GUIA DE PROCEDIMENTOS OPERACIONAIS PADRÃO – 2002. PMSP.
– Condor Industria de Armas não-letais. Fichário de especificações técnicas.
– CEATOX – Centro de Assistência Toxicológica do Hospital das Clínicas: Toxicologia da Capsaicina – Lacrimejantes- São Paulo – SP, 1999.
-Manual de Direito Penal. Júlio Fabbrini Mirabete. 21 ed. São Paulo; Atlas, 2006.
– Constituição do Brasil de 1988.
– Código Penal Brasileiro.
– Código Penal Militar Brasileiro.
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